sábado, 5 de janeiro de 2013

O Joio e o Trigo...



Como introdução gostaria de citar o significado de joio de acordo com o dicionario de lingua portuguesa:

"Joio: s.m. Planta da família das gramíneas, de sementes tóxicas, comum nos prados e nas culturas, onde prejudica o crescimento dos cereais.
Fig. Coisa de má qualidade que se mistura às boas e as prejudica.
Separar o joio do trigo, separar os bons dos maus, o bem do mal."

Não há o que contestar, a necessidade de dizimar o joio para que evitemos a contaminação do trigo  é indiscutível. Literalmente, sim, apenas literalmente... Pois em metáfora bíblica, bem e mal não dividiriam o mesmo espaço, não seriam processados juntos. Com o risco do mal contaminar o que de bem houvesse. Mas penso eu,  o que haveria de ser mal e o que haveria de ser bem, o que haveria de ser humano e o que haveria de ser aos olhos de Deus, divino.

Sim, refiro-me aos homens, refiro-me à dualidade humana, refiro-me à natureza humana e suas inúmeras características.

Há pouco, observei entre os devotees, um deles manifestando-se preocupado em criar regras para que nós deficientes possamos colher apenas o trigo e não o joio. Ou seja a ideia do bom devoteísmo e do mau devoteísmo. E fiquei eu a pensar quanto isso pesa, quanto isso camufla e pinta de duas cores o Devoteísmo: Branco e Preto. Luz e escuridão.  Incrível como somos todos frutos do misticismo ou religiosidade ainda que neguemos.

Antes de qualquer aspecto ou característica a primícia do devoteísmo é a atração pela deficiência e isso é ponto pacífico. O desenvolvimento do devoteísmo assim como nossas personalidades é único. Haveremos de encontrar um aquarela dentro desse universo. Devotees de amputadas, devotees cuidadores, voyers, pretenders, wannabes, etc. E dentro de cada preferência e exercício do devoteísmo outras tantas cores estarão presentes.

O quê me preocupa é essa tendência de se transformar em guetos algumas características dentro de cada grupo como se outras não fizessem parte do devoteísmo. 
Não há o joio e o trigo, há sim pessoas diferentes no exercício de uma preferência ou exigência. Desconsiderar que alguns  devotees possam ser compulsivos, caçadores ou que façam do deficiente um objeto é mascarar e enganar a quem busca informações. 
Mais grave ainda é querer dar ao devoteísmo ares de amores incondicionais e boas intenções para com o deficiente.
Claro, que o ideal seria que devotees e deficientes vivessem harmoniosamente sem as tais más intenções de um lado ou de outro... Mas... Paro e penso. Isso não é humano. E somos, como somos demasiadamente humanos. Criar regras, jogar o que não gostamos pra debaixo de letras bonitas não fará bem nem aos devotees nem aos deficientes.
Pelo contrario. Estão a colocar deficientes em um patamar além, bem mais alto do que seres humanos comuns. Estão a colocar deficientes como incapazes de assimilar e trabalhar quaisquer que sejam os problemas afetivos, sexuais ou emocionais. É um caminho que levará realmente deficientes a isso, a uma incapacitação de saber conviver com decepçõs quando a frustração diante de alguém, devotee ou não, se fizer presente.

As diferenças existem.  As diferenças gostem ou não quem lê, quem convive, quem debate, quem vivencia a propria deficiência ou o devoteísmo não vão deixar de existir apenas porque é mais cômodo fechar os olhos para essa diversidade, humana, sempre humana. Lembrando ainda que estamos falando de parafilias, de fetiches onde o campo é  ainda mais amplo para que surjam ramificações comportamentais.

Ouso dizer que é desonesto atestar que só devotees "bem intencionados" ou "livres de conflitos" sejam devotees.  Desonesto para com eles para com nós deficientes. 
Da mesma terra que nasce o trigo, nasce o joio. A mesma chuva que bebe o trigo, bebe o joio. E assim é no devoteísmo, da mesma atração comungam todos os devotees, todos. 
Se há a necessidade de escolha entre um ou outro devotee, que seja sempre e sempre uma escolha individual do deficiente e não vinda de uma discriminação do que é ou não devoteísmo. Até porque, não acredito em escolhas sem que todas as opções sejam apresentadas.

Muito fala-se do bom e do mau devoteísmo, muito argumenta-se sobre as formas de agir dentro do devoteísmo e vejo cometerem sempre os mesmos erros. Esquecem-se tanto devotees quanto deficientes que o mundo não é cor de rosa, que o mundo não é da perfeição, da simetria ou das tais boas intenções. O mundo é o que é. Nos privar da realidade, das vertentes sejam quais forem é preconceito revestido de hipocrisia.

Joio e trigo, uma questão de olhos, uma questão de procura e resposta. Basta observar que homens deficientes, alguns, aceitam melhor sexo por sexo com mulheres devotees. E então seriam as mulheres devotees que buscam um envolvimento emocional o joio nessa equação?

Não há como conviver dentro de conceitos fechados sem esbarrar na intolerância. Não há como limitar o ser humano sem castrar o que realmente somos.

Que separem o joio do tripo, os deuses. Os seres perfeitos. Não, não nós que somos humanos, demasiadamente e deliciosamente humanos...